07/05/2017

Cada um tem a mãe que merece?

Pela hora do almoço, e porque agora frequento casas-de-banho públicas leve, levemente, como quem chamam por mim, derivados de beber muito mais água do que antes e, eventualmente, ter a bexiga mirrada de tantos anos de camelice, fui dar com uma menina, com quatro anos ainda incompletos, a fazer cocó, perfeitamente sentada numa sanita pública, profundamente sozinha, com a saia e as cuequinhas puxadas até aos sapatos. Convenhamos que a louça sanitária destas casas-de-banho deve ser a zona mais limpa de todo o recinto, já que ninguém, no seu juízo perfeito, e se tiver mais do que quatro anos e for acompanhada por uma adulta, ali se senta. Diz-me a criança, mal entro: "Fiz cocó", e aquilo invadiu-me de ternura, porque o instinto é uma chatice que nos atinge sem pré-aviso nem dó. Perguntei-lhe pela mãe, e ela respondeu, literalmente, "Não está comigo", e deu um enorme arroto. Aquela menina era coisa para uma pessoa ter vontade de meter na mala e levar para casa. Procurei a mãe nas outras cabines, mas nada. Ajudei-a a sair da sanita e, naturalmente, ela pediu-me que a limpasse. ("Tenho o rabo sujo".) Não só limpei, como também a vesti. Enquanto o fazia, ela disse-me: "A minha mãe é muito gira". "Que bom que deve ser, ter uma mãe gira", respondi à toa, pasmada com o tempo que já havia decorrido desde que a mãe-gira não havia sentido a falta da filha-mais-uns-segundos-deste-amor-e-levo-a-para-casa. "Sim. E é mágica", continuou ela, o que me pôs a pensar que de certeza, pois só uma mágica está tantos minutos sem saber de uma filha daquela idade sem se preocupar ou sequer lançar o alarme no restaurante. Foi quando entrou uma mulher alta, farta, cabelo preto e frisado, óculos de massa grossos, e exclamou, tranquilamente: "Ah, estás aqui...". Ao fim de, seguramente, dez minutos.
(Dez minutos de desaparecimento de uma criança minha com aquela idade, e até a aviação civil já estaria a sobrevoar o restaurante.)
(Mas eu sou diferente.)


2 comentários:

  1. Olha, pelo menos é gira... e descontraída. ;)
    Beijinhos super mãe, suponho que a dada altura com eles nessas idades a tua única hipótese seria atarraxar um farol na cabeça de cada um.

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    1. Podes crer, só nós nos desgastamos, Be :)
      Beijinhos a ti, mãe de dois deliciosos macaquitos.
      Olha, houve uma época em que, se pudesse, lhes punha um chip. Ou um guizo. Uma corrente. (Ir à praia sozinha nas idades 8, 6, 4 e 2, como cheguei a fazer, era um pesadelo em tons de azul.)

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