25/03/2016

Diálogos à sombra # 19

O convívio comigo é sinuoso como uma dessas escarpas de onde podemos escorregar e partir os ossos todos, até ao metatarso, cá em baixo, na enseada. 
Saiu para um funeral, logo pela manhã, porque não é lá porque é sexta santa, ou feriado, ou porque não dá jeito, que as pessoas vão adiar morrer. Aliás, até é bastante consentâneo com o dia de hoje. Voltou horas mais tarde, e foi esse o momento em que eu resolvi travar um diálogo — travasse antes eu a língua, e o mundo viveria em paz.
- Então, o funeral, correu bem?
- Mas que pergunta é essa? Um funeral pode correr bem? E, já agora, pode correr mal?
- Pode. Corre bem, se corre tudo sem percalços. Corre mal, se alguém se larga a rir, se o caixão cai, se os herdeiros se pegam à bulha, se o morto, afinal, não está bem morto, eu sei lá... N hipóteses...
- Não, o meu cliente estava mesmo morto.
- Ai, o teu cliente morreu?
- Não, mas fomos ao funeral dele na mesma. 



6 comentários:

  1. Também não percebo isso de perguntar, se um funeral correu bem!
    ...sinceramente.

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    1. Eu também não, mas saiu-me, que queres? Hoje estava com o freio nos dentes.

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  2. Anónimo26/3/16

    Essa tua pergunta não é tão descabida quanto pode parecer. Imagina que durante o funeral algo ou alguém se intrometia pela negativa. Uma ameaça de bomba, por exemplo.
    'Prontes', fiquei com a impressão que não devia ter dito isto. Uma ameaça de bomba num funeral seria falta de respeito perante o morto.
    Esquece e finge que eu não disse nada :)
    Beijinho

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  3. Eu cá acho que o funeral tem bastante potencial para correr mal :P não acho uma pergunta assim tão descabida :P

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    1. Também eu. Isso e as cerimónias de casamento. Vou sempre com esperança que haja raia. Que um desista, mas aos berros. Que uma mulher dê à luz no meio da sala. Que o top da noiva caia. E é sempre o mesmo marasmo :P

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