30/01/2014

Não é mais do mesmo, é serviço público

Assunto: Praxes
Perspectiva: Bruno Nogueira

Esta é de Outubro do ano passado. Portanto, AM.



 E esta já é de Janeiro deste ano. Ou seja, DM.

 

Dica # 12

Amigos em casa e pouca imaginação?
Gulosos na área e nada para os empanturrar?
Crianças a chegar e nada no frigorífico?
Ataque de gula + facada na dieta?
Mal d' amour?

5 minutos
2 caixas de bolachas Oreo
1 lata de leite condensado
1 pacote de natas frescas + 1/2 pacote de chantifix

Partam as bolachas toscamente. Deitem-lhe a lata de leite condensado. Batam as natas com o chantifix até ficar chantilly. Misturem tudo.

É claro que fica melhor se for ao frigorífico duas horitas. Se não houver tempo, 20 ou 25 minutos de congelador fazem o mesmo efeito.



Eu achei que ficava giro, a mousse de Oreo em cima de granito polido. Agora já não acho, mas como tirei a fotografia e não me apetece desperdiçá-la...



Noutro cenário também me parece bonita de se ver. Embora, tal como na anterior, não tenha conseguido virar a imagem para horizontal. E sim, usei a seta redonda. E guardei. E ele não virou. Mas este post é sobre a mousse de Oreo.


Grande plano da bomba calórica. É fácil, é rápida, é para quem não tem paciência nem jeito para estas coisas, mas é também para quem já desistiu da carreira de modelo.

29/01/2014

Já que não posso dar sangue

Já me andava a incomodar a piadeira que os passarinhos, de vez em quando, faziam. Ia encontrá-los presos nas grades por terem as unhas muito compridas. São dois bicos-de-lacre (o nome reveste-se de erotismo - por via do "lacre" - mas não fui eu quem o atribuiu à espécie), minúsculos, como todos os bicos-de-lacre, assustadissíssimos, que quase se matam em voos desconexos contra a gaiola cada vez que alguém chega perto. Menos comigo, provavelmente por ser quem lhes dá de comer e lhes faz a lide doméstica. Às vezes sou empregada deles. Mas aquilo de ficarem presos e piarem um piar seguido, piiiiiiiiiiiiii, já me estava a fazer nervos, e comecei a fazer imagens mentais de aquilo lhes acontecer de noite e me morrer algum ou os dois e eu não aguentar de desgosto. Só que os tempos não estão para despesas e não me apetecia ir ao veterinário cortar as unhas aos passarinhos. Isso era a tiíce do ano, quase pior do que outro dia, ao degustar umas batatas fritas caseirérrimas, em que o meu primeiro pensamento foi "Iguaizinhas às que a empregada fazia quando eu era pequena". É que eu ainda sou do tempo em que não havia batatas pré-fritas e as batatas se fritavam em azeite, tanta era a abundância do que vinha lá das courelas. Então, calcei uma luva de borracha na mão esquerda, que é a minha mão mais meiga, e peguei num passarinho. A luva era para o caso de ele me picar, porque a minha única experiência em pegar em passarinhos era, até hoje, com periquitos, que são arraçados de papagaio, são psitacídeos, sabem? Têm aquele bico em forma de anzol, que magoa que se farta e ainda é capaz de arrancar um bocado de dedo ou uma unha inteirinha. E também tinha medo de largar o passarinho, naquele impulso de me defender, e ele ir contra uma parede e morrer. Também pus a luva porque assim evitei sentir a temperatura do corpo e o coraçãozinho disparado de pânico, e poupei-o à minha própria temperatura. Eu era uma cirurgiã de bicos-de-lacre naquele momento, não podia deixar-me levar pelas emoções. Peguei no primeiro passarinho e ele aninhou-se todo na palma da minha mão luva e deixou-se ficar quieto, à espera que eu lhe cortasse as unhas. Depois passei para a fêmea, que se fartou de lutar até eu conseguir agarrá-la, eu a julgar que, por ser rapariga, me ia facilitar a vida - mais frágil, mais meiga, mais branda - mas nada. Segurei-a com o mesmo cuidado, a ver se não a esmagava ou lhe partia uma asinha, e ela lá se encostou na palma da minha mão luva, até a tirei da gaiola e foi cá fora que fizemos a manicure, ela de cliente, eu de profissional. Portanto, se nenhuma das minhas profissões e habilidades pessoais puder ser fonte de rendimentos, hoje adquiri mais uma competência, que é cortar (com corta-unhas) as unhas a bicos-de-lacre. Já que não posso dar sangue porque estou anémica, sempre posso fazer a diferença de outra maneira.

26/01/2014

Granda golpada

Grande filme, grandessíssimos actores, ainda por cima só gente gira. Já não chegava o elencão da coisa para ainda nos salpicarem com o Robert de Niro. Não se faz.


E o filme até podia não valer nada, que só pela banda sonora já valia a pena ter pago o bilhete. Muito em particular por estas duas:

 

25/01/2014

Aceitação

Em todos os lutos existem as fases da negação, da raiva e da aceitação. Isto é científico, eu não inventei nada. Deve haver excepções várias para mortes auto-infligidas, lutos de crianças, etc.

Morre-nos uma pessoa querida e o mundo desaba. Mais uma coisa que não inventei eu. Desaba, literalmente. Tanto e tão definitivamente que andamos na rua incrédulos, como é que é possível que os autocarros continuem a circular e a parar nas paragens, as pessoas a entrar no café a beber a bica, até os pombos, o raio dos pombos, continuam a esvoaçar e a destemer pelas suas próprias vidas, a atravessar fora da passadeira com aquela calma que só tem quem não sabe que a vida acaba um dia. Nessa altura, passamos a maior parte do dia a dizer não, que disparate, não é nada verdade, até vemos a pessoa na rua, chegamos a ter sustinhos ah, vai ali! ou então acontece-nos qualquer coisa que gera logo um pensamento do género "tenho que lhe contar isto", em vez de "já nem lhe posso contar isto". Mas a fase da negação é para malucos e até o mais desacreditado quer que ela passe depressa, provavelmente porque sabe que está a ficar doido, a ver e sentir a presença de uma pessoa que morreu. Normalmente, porque todos precisamos de algum equilíbrio nesta barafunda, passa para a raiva, e vira-se contra. É o mundo que é uma merda, são as pessoas que não valem nada, tanto inútil que por cá anda e tinha que ser a mim que me morrias, e as pessoas más, por que é que não foram à frente, e tu, por que é que me morreste? E tu? Por-que-é-que-me-morreste? Não podias ter esperado mais uns anos? Custava-te muito esperar que eu morresse, para não ter que passar por isto? Não te aguentavas só mais uns meses, só até...? Como se a pessoa tivesse culpa. E tem. Mas tem. Só tem. Por qualquer mecanismo que não está ao nosso alcance, a pessoa que nos morreu tem a culpa, quanto mais não seja porque nos magoou desta maneira. E deu-nos um desgosto que não tem remédio. Não há volta, não há reconciliação, não há reaproximação. Não nos atende o telefone, desapareceu das redes, sumiu-se como se nunca tivesse existido e nós assim, todos rotos. E ela indiferente ao nosso sofrimento. Nem sequer temos como lhe fazer passar a mensagem, vá lá, o que é que é preciso que eu faça para que voltes? ou raios para ti, que me deixaste tão pobre e nem te importas. Só que esta fase também não pode durar toda a vida, sob pena de nos estraçalhar e até provocar a nossa própria saída de cena. Daí ser tão importante passar rapidamente à fase da aceitação. Chega. Já percebi. Acabou. Para isso, é preciso perceber por quê. O que é que falhou? A saúde? A resistência física? O cuidado com a própria integridade? A educação? A inteligência? A capacidade de dizer não?

É só isso que eles precisam de saber, para poderem aceitar.

22/01/2014

Acorda, Schumacher!

Please, please, please, ou bitte, bitte, bitte!

Já não se aguenta a blogosfera toda a falar dos mesmos dois assuntos, a dizer toda a mesma coisa! Toda a gente é tão porreira, tão organizada mentalmente que eu estou por aqui a pensar onde raios é que continua a existir preconceito (onde é que ele está? se quem mais escreve para as massas está imune a todo e qualquer pensamento e atitude que exclua homossexuais, pretos, gordos e deficientes...) e por que raios é que continuamos a ter Judiciária, Ministério Público e tribunais, se não fazem cá falta nenhuma, uma vez que a malta blogosférica faz o inquérito, o julgamento e dita a sentença, tudo no mesmo post?


21/01/2014

I wonder

Vi o "À procura de Sugar Man" com o devido atraso (Óscar para o Melhor Documentário 2013), mas mais vale tarde que nunca. Esmagador. Não se percebe como é que um talento assim passou despercebido nos Estados Unidos, terra natal, e foi alojar-se tão longe de casa (África do Sul) que nem o próprio Rodriguez sabia.

Hoje cantei isto todo o dia.


365 crianças vacinadas

Batem-me à porta duas pessoas com a farda da UNICEF. Atendo e começamos a conversar. O rapaz mantém-se calado, enquanto a rapariga faz as "honras à casa" e apresenta o projecto. Ao fim de poucos minutos, está a gabar-me a cor dos dentes. Marketing, mas é querida. Insiste, pergunta-me se fiz branqueamento há pouco. Que não, mas agradeço o elogio, ainda mais vindo de uma boca moçambicana, tudo alinhado e branco como neve. Fala-me das crianças de África, que, ainda hoje, têm que fazer vários quilómetros a pé, todos os dias, para irem "buscar água". Pus agora as aspas porque não é bem ir a uma fonte nem a uma torneira. É ir escavar na lama e beber o que a terra dá - impotável. Pergunta-me se posso prescindir de € 0,40 por dia para saber uma criança vacinada. São € 12,00 por mês. Dou-lhe os meus dados, negócio fechado. Acha que me enganei na data de nascimento. Marketing outra vez, mas está a ser querida. Insisto na verdade. Pergunta-me o truque para manter a forma. Continua a ser querida. O rapaz conta-me a sua trágica infância e a forma como a UNICEF lhe salvou a vida com dois anos de idade: vacinando-o. Era um dos subnutridos de Angola, um daqueles da barriga grande. Um dos que caminhava, aos sete anos, quinze quilómetros por dia para beber a tal água do lodo. E os olhos dele a encherem-se dessa água que tanta falta lhe fez, baixo eu os meus para dizer, estupidamente, "Não sou mais gorda porque como pouco". Às vezes, devia ser muda. Ainda assim, ele acha graça, ilumina-se todo num sorriso. Então ela gaba-me a simpatia. Contactam cerca de setenta pessoas por dia e só duas os recebem e aceitam o compromisso. Eu sou a número dois do dia. Isto não faz de mim melhor pessoa, mas posso ser a diferença entre a vida e a morte de uma criança. E essa diferença sabe-me bem. Se pensar que são 365 crianças vacinadas por ano, é uma multidãozinha. Todos os dias, para o resto da minha vida, até que a morte nos separe. A minha, OK.


20/01/2014

Deixem as pessoas viver a vida delas em paz, caramba!

Estou com a Preta, conto-lhe que vi ontem o "12 anos escravo". Quer saber a minha opinião. Se vale a pena ela ir ver. Se vale a pena levar o namorado (branco) ou ir sozinha. 

É um bom filme. É um grande filme. É enorme. Eu tirava-lhe uma grande parte. Nada nos diz, ao longo do filme, se já passaram 2 dias, 2 anos, 4 ou 10. A mim não me trouxe nada de novo porque, quem já leu "A escrava Isaura" e "A cabana do pai Tomás", já sabe tudo acerca de escravatura. O tronco, a separação da mãe e dos filhos, os abusos, o facto de os brancos, mesmo os mais misericordiosos, não terem noção nenhuma de que eram pessoas que ali estavam à sua frente, nada disso é novo. Trouxe-me outra vez vergonha de ser pessoa. Trouxe-me outra vez vergonha por algumas passagens da História da humanidade. E penso, ingenuamente, que vivo numa época privilegiada. Mas não vivo. O que é que se passa no Afeganistão? O que é que se passa na Índia? Quem é que me diz que, daqui a vinte anos, não vão descobrir uma vala comum com centenas de mortos? O que é que se passa nas prisões dos regimes não democráticos? E em algumas outras, dos regimes democráticos? Para onde é que vão as pessoas que desaparecem porque pensam de outra maneira? E o que é que se passa em Portugal, que uma pessoa não pode ser maricas à vontade? Nem tratar de uma criança porque dorme com alguém que é proibido por outro alguém? Eu não quero nascer pessoa na próxima encarnação. Estou farta de dizer lá para cima que me reencarnem macaca. Eu quero voar de galho em galho, comer amendoins e bananas e catar os piolhos dos meus filhos, agarrados às minhas costas e à minha barriga. Não quero viver esta vida de me preocupar se tenho barriga e se as mamas estão no lugar. Não quero ter o azar de ir parar a um harém e ser escrava sexual de um demente desdentado. Ou calhar ter uma cor de pele que não agrade a um grupo de gente e que isso seja o inferno da minha vida. Ou até ser fufa e alguém achar que pode meter-se nisso. Macaca, já disse. E não abro mão.

Ela, cidadã estrangeira, solteira, dois filhos, monoparente de primeira qualidade de duas crianças lindas, saudáveis e felizes, preta, hetero por acaso, de olhos negros enormes escancarados ao meu discurso e logo as duas a rirmos da ideia de mim, macaca. Mas e se ela hoje quisesse outra mulher em casa a viver com ela e a coadoptar-lhe os filhos, o que é que isso desgovernava na vida dos governantes que por cá temos? Quanto à dela, existe uma forte possibilidade de, no repartir de atenções, noites mal dormidas e despesas, aquelas crianças lindas, saudáveis e felizes ficarem ainda um bocadinho mais de cada uma dessas coisas, por  passarem a ter uma mãe mais disponível e realizada. Mais linda. Mais saudável. Mais feliz.

Qualquer dia despeço-a

Olha agora! Acabo de lhe relatar uma parte da minha vida (já nem sei o quê, se uma fase desta última gripe, se um episódio qualquer do fim-de-semana) e a gaja muda de conversa, fala-me de uma mulher que ela conhece e diz a seguinte frase: "Aquela também é meio maluca". 

Aquele também agoniou-me.

Também?

You meant...?

18/01/2014

A febre pode ter-me udido o último neurónio sobrevivo

mas ando preocupada com a aparência. Não suporto ver-me doente e amarela. Sei que um dia que esteja à morte hão-de ir dar comigo agarrada à caixa da maquilhagem.

Hoje quis fazer manicure como deve ser: com calma.

Peguei no tira-verniz e retirei, à força de 2 discos de desmaquilhagem, o verniz que tinha nas 10 unhas. Esta contabilidade é importante, quanto mais não seja para ver se chego a alguma conclusão. Tirei tudo, cortei as unhas - curtas e quadradas - repuxei as peles (não há como dizer isto de outra maneira) e cortei-as com alicate, passei a caneta de óleo e pus base. Peguei no verniz - o Clinique Happy - e comecei a besuntar a primeira demão.

Eu costumo usar vernizes baratos. Andreia, Essie, L'Oréal, Springfield, já tudo passou por estas mãozinhas e, com maior ou menor brio, todos se aguentaram uma semana, que é o que se pede a um verniz qualquer. Não me venham cá com a treta da três semanas do gel e do gelinho, que eu já andei anos a gel e sei muito bem que a primeira semana é para recuperar do trauma, a segunda para gozar as unhas bonitas e a terceira para esconder as raízes nem que seja nos bolsos. Este Clinique, quando era novo - há cerca de quatro semanas - aguentava-se dois dias e olhe lá. Não estalava nem saía por placas (o lascanço), mas desgastava nas pontas, o que é inadmissível num verniz que custa o triplo dos baratos.

Agora fui encontrar o meu Clinique espesso como papinha, mas insisti em pô-lo. À segunda unha, um montinho de verniz, que atribuí à falta de limagem (não faço, irrita-me, recuso-me). Vai de agarrar-me ao tira-verniz e tira tudo. Mais um disco de desmaquilhagem.

Recomecei a tarefa e pintei as dez. Esperei secar e dei-lhes a segunda demão. Mas e quando elas nos ficam com aquele ar pastoso que diz "Hahaha, eu nunca vou secar!"? Foi o que aconteceu. Digamos que largos minutos depois, deitei a mão ao bolso das calças para atender uma chamada e udi duas unhas (e ia udendo as calças). Foi a gota de água. Mais quatro discos e 10 ml de tira-verniz depois, e eu tinha as unhas ao natural.

Ainda estou em convalescença.

Clinique, udei-vos!

A minha gripe

Nos últimos quatro dias - hoje é o quinto - amarguei uma gripe daquelas boas que já não sabia o que era desde a infância, ou antes. Só vantagens: o povo agora reage à palavra gripe como antes a tuberculose ou talvez peste negra. Foge tudo a sete pés. Acham que vão morrer pelo contágio, porque, assim como assim, quase morta já estou eu. Num dos quatro dias tive que ir a uma reunião chata, mas onde bastou a mãozinha no ar e a palavra "gripe" para ninguém chegar perto com cumprimentos, menos ainda de beijinho. E foi rápida, não fosse a coisa dar-se por via aérea, que é a única via de contágio destas coisas virais. Também foi bom não ter tido, por quatro dias seguidos (excepção feita aos momentos em que tive mesmo que sair, mas aí vai de aviar as calças de ganga e a blusa preta e vais sempre linda, ó porca), de decidir o que raios vestir, saia, calças, vestido, o que calçar, o que é o almoço, o que é o jantar, é o amanhem-se que eu quero é sopas e descanso, literalmente. Pude ainda desfrutar da condescendência no incumprimento de trabalhos e tarefas várias, no adiamento e procrastinação de tudo o que era chatice e tarefa doméstica (sinónimos, eu sei), na lamechice do "não posso sair de casa, vem cá tu", enfim, já parecia um homem com tanto lamento por tão pouca coisa. Mas não sou. Ontem ainda estava péssima, depois de uma noite de febre e tosse, cai aquela saraivada de granizo, vejo-me ao espelho com o cabelo todo amolgado de tanta hora a suar na cama pelos piores motivos, pus-me a pintá-lo. Depois maquilhei-me e vesti um pijama lavado e assim fiquei, linda e menos porca, deitada na minha cama, a gozar o momento como uma criança que aproveita a febre no que de melhor tem não ir à escola. Deu-me tempo para ler o último do Mário Zambujal "O diário oculto de Nora Rute". Eu amo de paixão o autor, li tudo, tudinho o que ele escreveu, mas apenas porque ele começou pela "Crónica dos bons malandros", que é talvez, a par com mais dois ou três do coração, o melhor livro que já se escreveu em língua portuguesa. Porque, a seguir aos bons malandros, ele nunca mais escreveu nada assim, a não ser um bocadinho o "Cafuné", e esta Nora Rute só vem comprovar isto mesmo: o Mário Zambujal é tão excelente, para que raios é que escreve um romance só bom de vez em quando? 


16/01/2014

Morte súbita por levar com um raio, já

a quem disser as frasezinhas "A chuvinha faz muita falta" ou "Gosto tanto de ficar à lareira a ver chover lá fora".

Ou uma molha até aos ossos, também serve.

15/01/2014

Na minha casa também aparecem corações

Ai que fofis!

da sombra da alça da minha mala

Eu tenho demasiado tempo livre

Já lhe contei que a minha tia partiu duas costelas?

[NÃO. Toda eu grito NÃO. Até o leve tremor do meu corpo lhe berra "Não!". Não contou e eu não quero saber. Nem quero saber como é que a tia as partiu. Aquela tia dela é um camionista, pode ter partido duas costelas de qualquer maneira que não seja ter levado um bom amasso de um homem lindo. E, só por isso, já não me interessa]

Partiu e ia à médica [o povo nunca tem médicOs homens? É sempre A médica?] e ela não lhe encontrava nada [os médicos do povo são sempre exploradores frustrados?], até fez raio X [o povo jamais tira uma radiografia, faz sempre raio X] e nada [e, nos raios X do povo, nunca aparece nada], até que houve outra médica [hèlas!], a das urgências [claro], que lhe disse "Ah, você o que tem é duas costelas partidas!". E esta noite a minha filha foi lá dormir com ela, porque ela pode precisar de alguma coisa de noite, um copo de água, ou virar-se na cama, e assim a miúda está ali ao pé. Só que agora de manhã encontrei-a e ela tinha umas olheiras até aos pés, até lhe disse "Ó Tatiana, tu não podes ir assim para a escola, vais-te lá sentar e não vais ouvir nada do que a professora diz! Se sentires que estás com muito sono, dizes à directora de turma que estás cansada e vais para casa dormir". [Certo. Tatiana a caminho dos 18 anos, está no 8.º ano.]

Who. The. Fuck. Cares?

14/01/2014

Lamparina

Às vezes sinto-me mesmo aquele boneco d'A Zaragata. Sem ter feito nada por isso, o povo desata à briga à minha volta. E por minha causa. Repito: sem ter feito nada por isso. Ou pouca coisa, vá.


Encontrava-me na bicha das trocas da Primark. Parêntesis para explicar que eu já troquei tantas coisas na Primark que já fui mais vezes ao balcão das trocas do que às caixas normais. Tenho uma conta com sete folhas, todas agrafadas umas às outras. É o que dá não perceber que raio de número de sutiã de lá é que visto. Acabaram por me vencer pelo cansaço, depois de ter trazido o 34-B, trocado pelo 36-B, depois pelo 38-B e, finalmente, pelo 38-C, que vai até aos sovacos e não ampara as meninas na mesma. 

Entram duas galdérias pelo lado errado - ou certo, tudo depende da perspectiva - da bicha e passam à frente de uma data de gente. Umas dez ou quinze pessoas. Eu falei. Eu nunca murmuro. Falo. "Parece que há ali duas pessoas que passaram à frente de toda a gente". A que está à minha frente desata a murmurar. Está mal. Ou se fala ou se cala. Essa de bj-bj-bj é estúpida. Chamei uma empregada e dei-lhe conta do que se estava a passar. Ela foi à caixa e pareceu-me que disse qualquer coisa à colega. Entretanto, as duas galdérias já deviam estar a cozer em lume brando. Uma trintona de um metro e oitenta por noventa quilos e uma cinquentona de rabo gigante. Eu estava a medi-las porque a vida me tem ensinado que "tens sempre que tomar o tamanho ao bicho antes de te meteres numa empreitada". Isto é válido até para o trabalho.

Sai uma tonta lá de trás, da bicha, e vai direitinha ao armário de 1,80 metros. Dá-lhe um toque no ombro, que lhe valeu logo um berro: "Olha lá, conheces-me de onde para me estares a tocar?" [eu até concordei, mentalmente. Isto, assim desgarrado do contexto, é uma grande máxima, a reter]. "Vê lá se levas uma lamparina!".

A tonta, assim como saiu da bicha, voltou para ela. Mas a murmurar. 

"Ai a minha vida, estás mesmo a pedir uma lamparina!"

A outra galdéria, talvez por ser mais velha e mais sábia, aconselhava: "Cala-te, pá. Não fosteS tu que passasteS à frente, fui eu!". E também usava a palavra "númbaros". 

Eu também sou sábia, que me calei. Não ia ser possível o diálogo com pessoas que utilizam a quarta pessoa do singular e ainda dizem "númbaros". Por outro lado, se chegássemos a vias de facto, naquela situação eu ficaria claramente a perder, ganhando as lamparinas da outra. Imperava a lei do mais forte. Do mais gordo.

12/01/2014

Eusébio - O Pantera

Já tudo se disse acerca de Eusébio, por isso eu mais valia estar calada. Mas não me aguento, porque sou uma pessoa com problemas de integração, e quero é estar a par e passo com a blogosfera, para mostrar que também existo. E isto é como em tudo: não comentas o que se passa e não és cá da malta. 

Não posso nem quero dizer o que é que Eusébio significou na minha vida, porque senão depressa denuncio a minha faixa etária, e eu tenho uma frase de apresentação deste meu buraco a defender. Mas alguma coisa de muito importante significou, uma vez que, há uns meses, encontrei um gatinho todo preto na rua, a miar não sei de quê, se de fome, de sede, de frio, de falta da mãe ou só de ser mião. Cheirava malíssimo mas, mesmo assim, não lhe resisti aos miares e trouxe-o para casa, não para ficar com ele, por já ter as minhas gatas e não me apetecer ter para aqui um gatil, mas para lhe arranjar casa. Entretanto, não sei se dos miaus constantes do bicho, afeiçoei-me a ele e baptizei-o Eusébio. Foi por um só dia, já que a casa que encontrei para o receber era de sportinguistas - as minhas histórias nunca podem ser perfeitas? - e eles rebaptizaram-no Zorro. E foi assim que o "meu" Eusébio se transfigurou em Zorro sem apelo nem agravo.




Já fugi do tema, não já? Ah, OK. Era só para dizer que fiquei um bocado agastada com os jornalistas, tanto da TV como da rádio, que, durante as exéquias fúnebres de Eusébio, sistematicamente o trataram no feminino, a cause da alcunha, assim: "Vai sair o funeral da Pantera Negra", "O corpo da Pantera Negra vai dar uma volta ao estádio". Cambada de estúpidos, que não sabem falar a própria língua e, ainda assim, falam para multidões. E nunca se lembram que existem pessoas como eu, a quem tudo arranha os ouvidinhos histéricos de purista da língua, e que ficam incomodadas com estas coisas.

07/01/2014

"No recreio a cheirar cola"

Se calhar sou um caso único, mas serei mesmo a única pessoa que apanha um susto, escancara a boca, pensa uóóótedefac, vai lavar os ouvidos estranha de cada vez que ouve esta melodia?

Ou como daquela vez na escola
NO RECREIO A CHEIRAR COLA [???]
Fico tonto, zonzo, assim só de me lembrar

Como é que isto passou no crivo da nossa censurinha e continua, alegremente, a dar em todas as rádios, até na catoliquíssima (e puritaníssima, não me lixem) RFM?

Ou não é a este flagelo que se referem, mas tão só a cheirar a inocentinha cola Cisne dos trabalhos manuais, sem tolueno, o psicotrópico?



Ora lede o que nos diz a Wikiseca:

Os solventes que entram na composição da cola de sapateiro são lipossolúveis, isto é, dissolvem-se em gorduras. Uma vez inalados por via oral ou respiratória, atravessam a membrana hemato-encefálica e atingem rapidamente o cérebro, provocando alterações do estado de consciência que vão desde leves tonturas até fortes depressões do sistema nervoso central. Sendo altamente solúveis, são armazenadas no tecido adiposo e no tecido cerebral.
A ação do tolueno sobre o sistema nervoso provoca um sentimento de gratificação e entorpecimento, associado a vertigem e tontura, que começa em poucos minutos e pode durar até quase uma hora. Muitos usuários descrevem como sintomas a ocorrência de ilusões, sonolência, perda ou redução de inibições, sensação de estar flutuando e eventualmente amnésia.

aqui mais.

03/01/2014

Eu tenho problemas com médicos # 11

Visita ao centro de saúde da área da minha residência. Ando pobre e preciso de saber por que é que não consigo dar sangue. Estes dois factores conjugados levam-me lá. Sala de espera cheia. Já lá não vejo tantos ciganos nem tantas velhas. Parece que, estatisticamente, as mulheres estão a morrer antes dos homens, pelo que agora começa a haver mais viúvos do que antes. Quanto aos ciganos, talvez tenham enriquecido ou deixado de adoecer. Não entendi a mudança. 

Há ainda o homem da boina preta, que foi com a respectiva à médica. Ela usa um anorak confortável, de espuma, fofo, que a engorda ainda mais um bocadinho, calça sapatos de vela, tem queixo duplo aos trinta e é capaz de dormir só de encostar a cabeça à parede de azulejo do centro de saúde. E ele passa o resto da vida a olhar à volta, como os cães perdidos. 

E aquele outro, que olha para mim e diz, quase a gritar: "Já aqui estou desde as 8 da manhã, são 25 para as dez e nada de ser atendido!". Prefiro esbugalhar-lhe os olhos a dizer o que quer que seja. Não porque não o compreenda, não porque o tema - malucos e eu, enfim -, mas porque não me apetece conversar. Dali para as maleitas dele ia um passinho de bebé e eu estou farta de ser a psi de serviço.

Entra mais um velho, de sandálias calçadas em cima de meias grossas, porque os pés já não lhe cabem em sapatos nenhuns. Diz uma amiga minha que as extremidades nunca param de crescer. "Já viu velho de orelha pequena?". Não, nunca vi. Este tem-nas descomunais. Parece que vai levantar voo, não fora o facto de usar bengala. Quer a cadeira que está mais próxima da porta, ocupada pela mala de uma senhora. Faz-lhe só um gesto e ela retira a mala, ambos sem uma palavra. Senta-se a custo, apoiado na bengala, e ali fica, de boca aberta, a olhar para o tecto. 

Cada vez que vou ao centro de saúde deixo de acreditar.

02/01/2014

Começar a pés juntos

Oh pá, não me posso queixar. Como chove em barda há dois ou três dias, a minha vida tem sido passada entre a máquina da roupa, o estendal interior e os aquecedores. Fugi para o Terreiro do Paço anteontem à noite, ainda no ano passado, para ver o fogo de artifício, fui de metro, ganda maluca, aquilo à pinha, todas as raças e credos encaixados uns nos outros, e também algumas culturas diferenciadas, pois que me parece ainda ter respirado o mesmo ar que duas senhoras do Conde Redondo, que gritavam "Abre a porta!" no momento em que queriam sair, ao invés de "Deixa passar", que era a deixa correcta, uma vez que as portas estavam... abertas. Mas correu tudo bem, vi o fogo e voltei para casa cheia dele [fogo, pá] para meter mais roupa nos radiadores. Tudo em grande. 

Esta noite acordei com uma ruptura de um cano da água, de modos que já me udeu uma parede e o soalho a toda a volta. A mim anda-me a apetecer um soalho novo, que este já era, de modos que alaguei o resto do chão da casa, assim quase todo, para não parecer que era trote, e vai de chamar a companhia de seguros. Espero que o técnico seja um homem, senão estou lixada, que as gajas me odeiam. Já não se pode ter pestanas grandes. Estou muito crédula que vou beneficiar de um soalho novinho, sabe lá ele se eu dei com a ruptura às duas da manhã ou às dez! Simplesmente digo-lhe que tomei um comprimido para dormir [pisc pisc das pestanas] e só abri os olhos já o sol ia alto. A chuva vinha baixa, ou lá o que é. 

Claro que vai haver sempre moralistas a achar que isto é criminoso. Pois, sem dúvida. Eu também nunca disse que não devia estar presa. Mais criminoso é o que eu pago à companhia de seguros para os ver a correr à minha frente de cada vez que lhes mostro a seringa (alusão à expressão do rabo. Também tenho que explicar tudo!?).